Professor Lucas Milanez (UFPB) fala da atual conjuntura econômica brasileira

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Professor Lucas Milanez

Doutor em Economia, com concentração em Desenvolvimento Econômico, pelo PPGE/UFBA, Mestre em Economia, com concentração em Economia do Trabalho, e bacharel em Ciências Econômicas pela UFPB. Membro da Sociedade Brasileira de Economia Política – SEP. Coordenador do Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira (PROGEB). Coordenador da criação do Núcleo Multidisciplinar Celso Furtado. Pesquisa nas áreas de economia do trabalho, economia brasileira, economia internacional, ciclo econômico, análise do insumo-produto, teoria econômica marxiana e teoria da dependência. Em 2019, ficou em 2º lugar no Prêmio Brasil de Economia na categoria Tese de Doutorado. Em 2020, recebeu a Honraria Destaque Docente do ano do Corecon/PB.

[IDEF] O projeto “Globalização e Crise na Economia Brasileira” (PROGEB), que o Senhor coordena, tem como objetivo estudar diversos aspectos da economia brasileira, quer seja do ponto de vista macro ou microeconômicos, a nível nacional ou local. O Senhor poderia nos contar como surgiu o projeto e como ele tem sido desenvolvido ao longo desses anos?

O PROGEB existe desde 2002, e eu atuo no projeto desde 2006. O PROGEB foi criado pelo Professor Emérito do Departamento de Economia, Nelson Rosa Ribeiro. Ele escreveu sua tese de doutorado com o tema “ciclos econômicos”, defendida na década de 1980. O professor continuou trabalhando com esse tema – crises econômicas -, e quando veio para João Pessoa (1997), decidiu criar um grupo de estudos (2002) que buscava analisar a economia brasileira e sua conjuntura, a partir da teoria que ele havia desenvolvido em sua tese. Essa teoria se baseia nos preceitos econômicos marxianos, então é uma visão não tradicional, daquelas que não vemos nas grandes mídias, sobre o funcionamento da economia capitalista. Ou seja, o entendimento de que esse modelo econômico [capitalista] passa por períodos de maior ou menor intensidade no crescimento. Logo, o grande objetivo desse projeto é acompanhar o desenvolvimento da economia brasileira capitalista e sua ligação com a economia internacional.

O objetivo fundamental é acompanhar o processo de mudança das fases daquilo que chamamos de ciclo econômico, movimento composto por 4 fases: crise, depressão – ou fundo do poço -, reanimação da economia e o auge do crescimento, até que venha uma nova crise e tudo se repita. Com isso, surgiu o PROGEB.

Eu entrei em 2006, ainda como graduando de economia, no segundo semestre. Entrei no PROGEB como voluntário, logo depois virei monitor, até começar efetivamente a iniciação científica dentro do projeto. Já no mestrado continuei no PROGEB como professor substituto (ainda não atuava como coordenador, mas como um dos professores do grupo). Com isso, comecei a estudar outras coisas, como aspectos microeconômicos do processo de produção. Não podemos falar hoje em dia, por exemplo, de cadeias globais de valor sem falar de uma gestão de produção, gestão da cadeia produtiva e também gestão da própria unidade produtiva. Esse foi o tema que abordei em minha dissertação. Foi no doutorado que comecei a ter um contato mais amplo com teorias do desenvolvimento, questões ligadas ao desenvolvimento regional e nacional, além da inserção das economias nacionais na economia mundial, por exemplo, estudando teoria da dependência e estruturalistas. Logo, tive a oportunidade de investigar a economia brasileira a partir de uma visão mais ampla, mais preocupada com o desenvolvimento e não com o crescimento, como na economia se costuma falar [eu particularmente não sou partidário dessa divisão tão simples, mas faz parte da economia]. Quando voltei do doutorado, em 2018, assumi a coordenação do PROGEB – que continua trabalhando com ciclo econômico, mas, claro, foi diversificando suas linhas de pesquisa que eram coordenadas no grupo. 

[IDEF] O PROGEB continua atuando durante a pandemia? O grupo atua de forma remota?

Sim! Na verdade, escrevemos análise de conjuntura toda semana. Nos reunimos na segunda-feira pela tarde. Nessas reuniões apresentamos os jornais econômicos – utilizamos o Valor Econômico hoje em dia -, mas também já usamos o Gazeta Mercantil (que já não existe mais), a Folha de São Paulo, etc. Lemos esses jornais – cada pesquisador lê um dia da semana – e traz as principais notícias sobre a conjuntura econômica brasileira e internacional, assim como questões políticas – que não são estritamente econômicas – mas influenciam na economia. Fazemos a leitura e apresentação dessas notícias (na segunda-feira), um dos professores recolhe essas notícias e escreve uma análise daquilo que aconteceu na semana imediatamente anterior. Em nossa última reunião apresentamos todos os jornais da semana passada, e um dos professores – no caso o prof Nelson -, que com 82 anos continua ativo no grupo, é nosso Conselheiro. O prof Nelson compila as notícias e está escrevendo uma matéria de 60 linhas, que publicamos em nosso blog, Instagram e Facebook. Essa análise é a análise de conjuntura da semana anterior, que pode versar sobre um tema específico ou então sobre a economia em geral. Por exemplo, recentemente, em uma das minhas análises, falei sobre o aumento das taxas de juros pelo Banco Central. O PROGEB realiza essas reuniões semanalmente, independentemente de feriados. Inclusive, desde 2009, nós religiosamente publicamos 52 análises de conjuntura por ano, sendo 1 para cada semana. Portanto, temos um conteúdo muito extenso em termos de escrita. Continuamos a realizar esse trabalho, seja com pandemia, férias, etc. Mesmo na época do contrato do PROBEX ser 8 meses, ainda produzimos análises nos 4 meses que não tinham contrato. Como gostamos de dizer, não paramos porque a economia não para. O Brasil não para. Por isso, precisamos estar sempre acompanhando as últimas notícias. Se deixarmos de olhar o que está acontecendo no calor do momento, perdemos um pouco do “fio da meada”, para sair e voltar a entender o assunto apropriadamente, é mais difícil.

O objetivo do PROGEB é acompanhar o ciclo, acompanhar a economia brasileira – faz isso desde 2008.

Na verdade, desde 2002 já publicamos por via impressa no jornal “Contraponto”, que já deixou de existir. Nosso trabalho é tornar a linguagem da análise o mais simples possível, para que o texto seja acessível para o público-geral, e não apenas para economistas. O PROBEX que criamos para contribuir para essa atividade é o “Observatório Econômico: Explicando a Economia”, que tem como objetivo fazer uma explicação mais suave, com menos “economês”, e quando tem, tentamos explicar. Ainda que, às vezes, seja tranquilo, 60 linhas é sempre muito pouco para escrever sobre determinados assuntos. Assim, tentamos popularizar e tornar mais acessível o conhecimento de economia.

[IDEF] Como o Senhor avalia os impactos do projeto na formação de opinião dos alunos, professores e da população em geral?

Isso já foi mais intenso, acredito que o momento político que a gente vive está muito difícil, a pluralidade é muito restrita. Em momentos passados, tínhamos muito mais pluralidade e interesse, digamos assim, em conhecimentos diversos. Como mencionei, fazemos análises diferenciadas, que não seguem a mesma linha da grande mídia. Se pegarmos as teorias econômicas de forma geral, podemos dividir da seguinte forma: pró-mercado, pró-Estado e pró-classe trabalhadora. Obviamente, a teoria marxista está muito mais ligada a entender o funcionamento do capitalismo, mas também mostrar quais são os problemas que o capitalismo possui. Logo, os movimentos sociais, classe trabalhadora, partidos políticos e sindicatos, se interessam por escutar porque faz parte também da formação intelectual entender um pouco de economia, de como as coisas funcionam. Sendo assim, participamos de atividades de formação de quadros políticos, sindicatos e movimentos sociais. O último que lembro, no momento, foi quando fizemos uma atividade sobre crise econômica para uma cooperativa de catadores de recicláveis de Mandacaru (antes da pandemia). Outra atividade realizada foi falar um pouco sobre capitalismo para um grupo que fazia uma ocupação de um prédio abandonado aqui em João Pessoa, no Distrito Industrial.

Então tentamos levar esse conhecimento para fora da universidade. Na verdade, esse é o nosso principal objetivo: levar o conhecimento para além do âmbito universitário, para quem se interessar e desejar ter uma visão alternativa dos fatos econômicos e isso é fundamental para nós. 

Além disso, também é importante fazer a formação dos estudantes, das pessoas que trabalham conosco. Primeiro, é necessário haver o interesse, obviamente. Economia, infelizmente, não é algo que as pessoas, de forma geral, têm muito interesse em entender. Quando querem, é para saber como ganhar dinheiro ou como economizar, no máximo. Mas, poucos procuram entender como funciona a sociedade, como funciona a distribuição de riqueza, os problemas sociais, os problemas advindos de uma economia, etc. Então, as pessoas que normalmente procuram o PROGEB estão preocupadas com isso. Nós possuímos a preocupação de fazer a formação teórica e a formação prática desses pesquisadores, para que eles possam também fazer essa leitura da realidade a partir da perspectiva que temos. É fundamental fazer essa formação para qualificar e criar um senso crítico e de responsabilidade social nos novos pesquisadores. Como já disse, existe até certo ponto, já aconteceu do contrário, quem busca o PROGEB sabe daquilo que estamos fazendo. Isso é bom, pois há um alinhamento em termos de interesses. Aqueles que se formaram com a gente, por exemplo, hoje em dia temos um membro que assessora a equipe econômica que está discutindo no Congresso Nacional o processo de independência do Banco Central. Além disso, temos também pessoas que trabalham no setor privado, como um pesquisador que atualmente trabalha com o setor de petróleo e gás, em Campinas-SP.

Por fim, também temos professores e pessoas que estão na área acadêmica. O PROGEB possui uma diversidade muito grande, mas todos eles, de uma forma geral, são muito generosos quando falamos sobre a formação e aquilo que aprenderam com o projeto. 

[IDEF] Agora falando sobre a atual conjuntura econômica do país, como a economia brasileira tem se comportado desde o início da pandemia? Que estratégias econômicas adotamos e que resultados temos obtido até o momento?

Para falar sobre o que aconteceu durante a pandemia, eu preciso, obrigatoriamente – como acompanho o ciclo econômico brasileiro e mundial -, dizer que o que vivemos hoje é o cenário da crise da Covid-19. Então, vivenciamos efetivamente uma crise econômica, o Brasil passou por uma crise muito severa, nesse caso. Foi apenas nesse semestre que tivemos um novo “peak”, e conseguimos voltar ao patamar de produção pré-pandemia.

Entretanto, é preciso entender que essa crise econômica da Covid-19, na verdade, já estava se manifestando no Brasil e no mundo ao final de 2018. O ciclo econômico, o movimento cíclico – essa alternância entre o momento de maior aquecimento e menor aquecimento da atividade econômica -, essa mudança de humor ou estado do comportamento da atividade econômica capitalista se altera em uma média entre 7 e 11 anos. Mais precisamente, podemos estabelecer uma média de 10 em 10 anos. Ou seja, nesse período presenciamos uma nova crise econômica no mundo e, claro, nos países capitalistas.

Curiosamente, a última crise havia ocorrido em 2007-2008, a Crise do “Sub-prime”, que se iniciou nos Estados Unidos e logo se espalhou pelo mundo, chegando no Brasil ao final do ano de 2008, início de 2009. Para resumir o que aconteceu, baseado na política econômica: os Estados tentaram salvar as empresas, os bancos, etc. A economia não caminhava às mil maravilhas, mas começou a se recuperar novamente. Logo, voltou à fase de aquecimento, ainda que fosse moderado. Com isso, a economia mundial foi crescendo, já o Brasil, nem tanto. Portanto, o mundo já estava na fase de aquecimento da economia, e as condições para que uma nova crise acontecesse foram gestadas nesse período entre 2007-2008, até agora. Tanto que, em 2018, sem falhar – ao se completar 11 anos da última crise -, a economia mundial começou a desacelerar. A produção industrial de vários países, como Alemanha, Estados Unidos, maior parte dos países da Europa, Japão, estava desacelerando, no final de 2018 e começo de 2019. Antes mesmo de haver pandemia.

Sendo assim, a economia mundial já estava em desaceleração. A crise econômica já estava acontecendo. O fator diferencial de todas as outras crises anteriores foi, justamente, que durante essa crise veio uma pandemia, algo que na história da humanidade tinha sido visto poucas vezes.

Com isso, o mundo inteiro teve que fechar suas portas e se isolar. Muitas pessoas morreram, etc. Basicamente aquilo que podemos ver hoje. Infelizmente, aquilo que podemos ver no Brasil, inclusive. Algo absurdo, que realmente não há palavras para descrever. Portanto, a pandemia veio agravar uma crise que já acontecia. Realmente, foi uma situação atípica, totalmente nova. Dessa forma, a crise econômica se agravou ainda mais por fatores que não são econômicos. Se fosse uma crise econômica normal, típica do capitalismo, os fatores econômicos, ou as medidas econômicas tradicionais, resolveriam o problema. Como uma intervenção aqui e ali do Estado, uma tentativa de salvar emprego e renda, seria suficiente. O problema é que não estamos em uma crise comum. Vivenciamos uma crise muito pior. E, obviamente, o Estado deve reconhecer isso – a dimensão do problema – e também deve tomar medidas de acordo com a dimensão desse problema. 

Para começar, no caso do Brasil, de imediato, já sabemos que o Estado – o Governo Federal -, não entende, até hoje, a dimensão da crise sanitária que vivemos. E, por isso mesmo, não tomou as medidas devidas e adequadas para enfrentar a pandemia e a crise agravada por ela. Claro, muito dinheiro foi gasto. Estima-se que os gastos que o Estado brasileiro realizou ano passado – e esse ano – vão chegar a mais de 500 bilhões de reais. A maior parte desse valor foi transferência de renda, com o auxílio emergencial, principalmente o do ano passado, que foi mais elevado e para mais pessoas, e o auxílio mais baixo deste ano. Uma parte, se não me engano, algo em torno de 300 bilhões de reais, foi para isso. Claro, isso é estritamente necessário e fundamental. Foi importante, inclusive, para que pudéssemos entender a dimensão do problema estrutural, uma problemática que o Brasil tem mais profundamente.

A distribuição de R$ 600 para a população fez reduzir a desigualdade social no Brasil como nós tínhamos visto poucas vezes na história do país. Com isso, podemos compreender um pouco do tamanho da miséria estrutural que o Brasil vive. Logo, quando chega uma crise desse tipo, a situação das camadas mais pobres é ainda pior.

O auxílio foi algo extremamente positivo, mas é importante pontuar que no começo o Ministro da Economia (Paulo Guedes), queria dar R$ 200 em três parcelas para a população. Foi o Congresso Nacional que ajustou esse valor e ampliou, obviamente, o tempo de distribuição desse dinheiro. Então, primeiramente, o problema fundamental foi que não houve o reconhecimento da dimensão do problema. Consequentemente, não houve a adoção de uma política econômica adequada durante a pandemia. Em termos de número, R$ 500 bilhões de reais é muito dinheiro para uma economia como a nossa. Porém, a forma como ele foi empregado, e também, olhando para esse valor e os problemas que a economia já tem – inclusive problemas antigos, mas que foram agravados agora –  podemos constatar que não foi o suficiente. Por exemplo, o Brasil não teve financiamento Federal para produzir aquela que é a vacina mais distribuída no país até hoje, a CoronaVac. Até hoje, não se sabe exatamente o quanto o Governo Federal gastou e se realmente gastou. No período anterior não, nada foi gasto, pois foi o Governo de SP que fez esse financiamento – o Governo Federal não participou. Então, no final das contas, podemos ver que até a vacina que foi desenvolvida aqui, não teve a participação direta do Executivo. 

Desse modo, o Brasil não atacou os problemas fundamentais. Faltou álcool, máscara, respiradores, insumos, etc. Muitas coisas básicas para controlar o problema agravado pela pandemia. Se o Brasil tivesse conseguido direcionar os investimentos – ou créditos – para empresas que pudessem produzir máscara, álcool em gel, luva e insumos, teria resolvido o problema da saúde e, de certa medida, amenizaria o problema da economia, uma vez que iria gerar emprego e renda em setores extremamente relevantes.

Logo, não podemos dizer que o Brasil tomou as atitudes – do ponto de vista da política econômica – ideais para combater a pandemia da Covid-19. Pelo contrário, a distribuição de renda foi muito boa, porém, graças ao Congresso Nacional. Mas, as outras medidas não foram eficazes. Além disso, a CPI está nos mostrando que houve um boicote completo em relação à vacinação, desde o ano passado. Portanto, não podemos dizer que o que foi feito foi bom. Inclusive, existe um site muito interessante chamado Orçamento Covid, criado pelo Tesouro Nacional.  Lá podemos ver as despesas do Governo Federal, e o orçamento detalhado de todos os gastos com a Covid, que aconteceram desde março do ano passado até hoje. É interessante conferir esses dados para entender melhor o que estou falando. Por exemplo, a questão do lockdown e a escolha entre economia ou vida. Na verdade, isso é um absurdo tanto do ponto de vista científico na economia como na medicina.

Na economia, sabemos que existem fatores de produção – ou forças produtivas – que fazem a economia girar, como: máquinas, equipamentos, matérias-primas, energia, etc. Todo material que precisamos para produzir mais, obviamente, o próprio ser humano. Como é que com morte, doença, internação, ausência do trabalho, o ser humano poderia produzir? Como ele poderia fazer a economia efetivamente andar, se estava doente ou internado? Claro que não tinha como. A economia só anda se as pessoas estiverem bem, se tiverem saúde.

Inclusive existem estudos, vastos estudos, que mostram como a saúde impacta na produtividade do trabalho. Claro, isso é reflexo do comportamento anti-científico do governo. Faltou uma tentativa de ver os estudos, aquilo que a ciência já produziu, em relação às consequências – não só no campo da saúde, mas no da economia, e ver como se combateria isso. Deveria ter tido um programa muito mais amplo de apoio ao pequeno produtor, ao comércio local, estímulo e garantia de que alguns setores não seriam prejudicados com o lockdown, que obviamente deveria acontecer, e o Estado cobriria parte dos custos econômicos que viriam com o lockdown. Obviamente isso não aconteceu. Muitas vezes os governos estaduais complementavam o auxílio emergencial com seu próprio orçamento. Logo, as medidas não foram, de forma alguma – tanto na área sanitária como na econômica – importantes. Volto a dizer que o auxílio emergencial sim, foi extremamente importante, mas aquilo que era bom acabou em dezembro do ano passado. O que temos atualmente já não é capaz de suprir as necessidades sociais do país. 

[IDEF] No início da pandemia, o prognóstico de especialistas e de instituições internacionais era de que teríamos uma grande recessão econômica mundial pela frente. De fato, os países mais pobres e em desenvolvimento têm sofrido com os impactos econômicos e sociais da pandemia (resultando no aumento da pobreza, da fome e do desemprego). No entanto, alguns países já estão retomando seus índices de crescimento pré-pandemia – como EUA, China e Reino Unido. Como o Senhor explica essa desigualdade no crescimento econômico entre os países? Quais seriam os caminhos para o Brasil retomar o seu desenvolvimento, à semelhança de outros países?

Primeiramente, falando um pouco dos países periféricos, digamos assim, são países que de fato estão sofrendo mais, pois a desigualdade é maior, não só em termos em relação à própria situação da renda interna, mas também estão ficando para trás em relação aos países mais avançados. Então, é uma desigualdade dupla. Uma desigualdade que está dentro do próprio país, mas também entre os países. Logo, a situação de um país periférico é mais complicada. Podemos citar, como primeiro fator, aquilo que chamamos de índice de complexidade de determinados países. Alguns Estados, por exemplo, possuem uma estrutura com um nível de complexidade de tecnologia mais avançado. Se formos analisar aquilo que é a tecnologia mais avançada hoje, a microeletrônica, alguns equipamentos de transporte e a Indústria farmacêutica, e que produz equipamentos médicos, óticos, etc. Podemos observar, portanto, que essas são as principais tecnologias de ponta hoje em dia, aquilo que exige mais conhecimento científico e investimentos para pesquisas de desenvolvimento. Nos países periféricos essas Indústrias, normalmente, são atrasadas. Por exemplo, quem for fazer uma ressonância magnética em um desses lugares, vai ver marcas como Panasonic, Samsung, Philips, etc. Nunca iria ver uma multilaser, por exemplo, uma empresa nacional. Portanto, essas tecnologias são desenvolvidas nos países mais avançados. Por um lado, o fato de existir nesses países a fabricação daquilo que é necessário para sair da pandemia já é um pontapé inicial, que já os coloca mais a frente. Claro, que nem tudo que se precisa para sair da pandemia é de alta tecnologia, mas existe uma estrutura, um know how, um agrupamento de indústrias que vão subsidiar essa atividade, com efeitos de encadeamento.

Por exemplo, quando se produz um respirador, necessita-se de vários materiais que são produzidos em locais diferentes e indústrias diferentes. Isso trás um efeito de arrastamento, digamos assim, você puxa o resto da economia quando isso acontece. Os países que possuem dentro do seu território uma estrutura produtiva que forneça esse tipo de equipamento, quando ele é acionado, será gerado algum grau de aquecimento da economia, obviamente. Com os países periféricos, isso já não acontece.

Além disso, esses países periféricos possuem uma estrutura produtiva menos complexa e avançada do ponto de vista tecnológico, o que cria problemas para o próprio funcionamento da economia, sobretudo para o emprego e para geração de riquezas. Os países com menos recursos não possuem os setores mais complexos – de ponta -, e os setores que vão gerar mais riqueza e dinamizar a economia. Claro, há algumas exceções. O Brasil, por exemplo, tem o setor automobilístico e a aviação. Porém, tem um setor de serviços muito inchado, sobretudo serviços de baixíssima qualidade, serviços pessoais, que são extremamente afetados quando temos qualquer tipo de crise ou problema econômico. Por exemplo, as pessoas deixam de ir ao cabeleireiro, deixam de comprar determinados produtos, como carne, deixam de comer fora, etc. Portanto, tem muitos serviços que servem para as pessoas não morrerem de fome, ou seja, serviços que possuem uma boa renda mas não são de alta qualificação ou tecnologia. E, por isso mesmo, não são estritamente necessários. Quando acontece uma crise econômica, esse setor sofre logo com a redução da demanda por seus produtos e atividades. Então, há um impacto muito maior sobre esse tipo de país por causa dos setores que compõem a sua estrutura produtiva. São setores muito mais vulneráveis à variação da demanda e da renda, porque são serviços não essenciais. Logo, esse tipo de setor só vai voltar a crescer quando a economia retomar seu crescimento efetivamente, o que demora um pouco mais. A renda, de uma forma geral, precisa crescer para que esse tipo de setor possa crescer junto. Portanto, os países periféricos sofrem bem mais por causa da própria estrutura produtiva, daquilo que são setores que dinamizam ou que garantem a renda para uma parte muito grande da população.

Se analisarmos o Brasil, a estimativa é que cerca de 40% dos trabalhadores brasileiros estão na informalidade. É literalmente se virar da maneira que pode para sobreviver.

Sendo assim, é um tipo de atividade que vai demorar efetivamente para se recuperar. Consequentemente, a economia como um todo, o aspecto macro da atividade econômica, vai sim demorar a se recuperar. 

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Foto por Henrique Hanemann do Unsplash

Essa é uma diferença fundamental entre os países periféricos e os avançados. Os próprios Estados dos países avançados possuem uma capacidade de intervenção maior. Como há uma maior geração de riqueza, também há uma maior apropriação dessa riqueza pelo setor público. Logo, esse setor terá mais espaço para endividamento, por exemplo, assim como poderá aumentar um tipo de imposto para arrecadar mais e investir em algum tipo de política pública. No caso dos países periféricos, eles podem se endividar, mas geralmente esse endividamento é muito caro. Também não podem aumentar imposto porque a população não aguenta mais a elevação de taxas. 

Ademais, a própria estrutura também é um fator fundamental. O que caracteriza a estrutura de um país periférico? Temos uma estrutura produtiva atrasada, com empregos de baixa qualificação e um Estado com pouca capacidade de contribuir para o processo de expansão econômica. Já no caso das potências mundiais, temos uma estrutura produtiva avançada, com produtos que têm o efeito de influenciar o resto da economia com maior qualidade e mais positivamente. Além de um Estado capaz de intervir e realizar intervenções mais adequadas.

No caso do Brasil, acredito que a primeira coisa a ser feita seria o impeachment, ou seja, derrubar o governo atual. O Brasil não pode continuar da maneira como está. Chegamos recentemente aos 500.000 mortos, e o Presidente da República – aquele que deveria nortear a política pública nacional – deveria unir todos os governadores e prefeitos, junto à população, para resolver o problema de maneira conjunta.

A pandemia é um problema de toda a sociedade, não é um problema de partido.

O correto para avançarmos seria trocar toda a estrutura do Executivo Nacional, pois aquela estrutura é incapaz de resolver os problemas atuais do Brasil, porque é uma estrutura que, inclusive, ao invés de discutir como melhorar a vacinação e como melhorar o sistema de saúde para evitar mais mortes, está vendendo a Eletrobrás, que é uma das empresas responsáveis por boa parte da nossa água, inclusive. Esse tipo de discussão não dá para acontecer neste momento. Por exemplo, o Ministro da Agricultura discutindo com o Ministro da Economia sobre como “comer migalhas”, ou pegar o resto do prato de comida da classe média para entregar à classe pobre. Esse tipo de coisa não pode ser admitido. Esse governo não vai resolver o problema, pois a política que está sendo adotada é incapaz de atuar para isso.

O Brasil precisa de união – de todas as classes, Estados, todo mundo – em torno da resolução de um problema – que não é econômico -, porque a economia só vai se resolver quando o problema sanitário for resolvido.

Como comentei, nós já estávamos em crise, mas esse buraco só foi causado por uma questão que não é da economia. 

Portanto, primeiro deve ser resolvida a questão da saúde – aquela que está agravando a economia -, e depois resolver os problemas econômicos. Se isso acontecesse de maneira conjunta, seria ótimo. Para isso, deve-se focar na questão que foge à política econômica, o problema da saúde pública. Obviamente, esse é o problema que está causando dor para milhares de pessoas e famílias. Para resolver essa questão, se com a participação do empresariado e dos trabalhadores nacionais, com a criação e riqueza interna, ótimo.

Se, por exemplo, conseguir produzir respiradores, insumos e vacinas aqui no Brasil, é o cenário ideal, pois se estaria gerando riqueza internamente, que seria distribuída no próprio país. Se não, que se resolva esse problema e depois se crie um programa de recuperação econômica. É necessário aproveitar o momento.

Os EUA, por exemplo, estão aproveitando o momento para mudar a forma como eles estão olhando para o futuro. A China também segue a mesma lógica, aproveitando-se dessa crise para mudar o futuro do capitalismo e da tecnologia. O Brasil está a milhões de quilômetros de distância, na verdade temos uma privatização que preza por termelétricas, queimar gás, carvão, petróleo, para podermos produzir energia elétrica. Enquanto isso, nos EUA e na China, já se fazem investimentos de bilhões, trilhões de dólares para a produção de energia limpa. Portanto, não é absolutamente possível resolver esse problema da maneira como estamos.

Temos que pensar no futuro. E para que esse tipo de projeto aconteça, é necessário haver a união, que haja uma mudança completa na forma de pensar a política no Brasil, de uma maneira geral.

Claro, temos várias possibilidades, seja esquerda ou direita. O essencial é que o Brasil precisa mudar, e se isso não acontecer vamos perder uma janela de oportunidade de mudança. Na próxima eleição, por exemplo, vamos ter essa janela. Isso é algo que a população como um todo deve buscar, pois se os brasileiros não se juntarem para correr atrás, não será um político sozinho que resolverá todos os problemas.

[IDEF] Nós temos visto que, em termos de política de saúde, muitos estados e municípios brasileiros têm buscado autonomia, tomando suas próprias decisões e estratégias no combate à COVID-19, de forma descentralizada. Em relação às questões econômicas, seria uma boa opção para os entes federativos brasileiros tomarem decisões autônomas? Eles possuem capacidade e condições para isso? 

Na verdade, esse acaba sendo o único jeito. Ou eles atuam de maneira autônoma, ou acabam não podendo fazer nada, pois se for depender do Governo Federal nada seria feito. Na realidade, esse era o objetivo do governo, que entrou no STF para impedir estados e municípios de tomarem suas decisões de forma autônoma. Foi o STF que resolveu que os estados e municípios podem fazer aquilo que quiserem. Portanto, não é uma opção. Os entes subnacionais, nesse contexto, precisam atuar de maneira descentralizada, independente do Governo Federal.

Entretanto, isso não é o ideal. Em uma situação como a que vivemos, o ideal seria haver a organização e a associação de líderes e gestores para que as decisões fossem coordenadas. Quando se trata de uma pandemia, temos o descontrole de uma doença. Logo, não há como um município isoladamente ou um estado isoladamente resolver a questão sozinhos. A situação é complicada. E, para piorar, temos o Presidente da República desembarcando em vários estados diferentes para fazer aglomerações.

Um ponto que é interessante, mas pelo menos na mídia não há tanta visibilidade, é o Consórcio Nordeste, criado em 2019, em uma ocasião diferente, como uma espécie de organização coletiva dos governadores dos estados do Nordeste – todos de oposição – para se organizar em relação aos desmandos do Governo Federal. O Consórcio vem se articulando, tomando medidas para amenizar os problemas da Covid-19, assim como criando medidas de saída para quando essa crise acabar. Por exemplo, foi o Consórcio Nordeste que negociou com a Sputnik, para ver se trazia a vacina russa para cá. Isso é algo importante. Porém, ressalto que não é o ideal. 

Por exemplo, se aquilo que o governador de SP conseguiu fazer em seu estado se espalhasse para todo o Brasil, aquele rigor de produção de vacina, assim como as medidas que vêm sendo adotadas pelo governador da PB e pelo governador do MA, poderíamos ter sucesso em âmbito nacional. Logo, existem exemplos de pessoas isoladas que estão fazendo bem o seu trabalho. O problema é que trabalhar isoladamente nessa situação não é o ideal. Assim, fica difícil sair da crise econômica, pois o orçamento estará, muitas vezes, destinado para resolver problemas de saúde e não sobra necessariamente dinheiro para fazer outras coisas. A não ser que haja algum tipo de privilégio, alguma forma de preferência adicional. Isso pode acontecer, obviamente, a depender se o governador ou prefeito é aliado ou não do Governo Federal. Isso acaba influenciando, por exemplo, as universidades. Muitas universidades sofreram redução no seu orçamento – uma redução drástica -, enquanto outras não receberam cortes tão profundos, coincidentemente associando-se aquelas que estão sob intervenção. Enfim, se não houver articulação política a situação fica muito difícil.

Outrossim, em relação à vacina, já existem estudos – em relação aos países avançados – que mostram uma correlação positiva entre o crescimento do PIB nos últimos trimestres e o índice de vacinação do país. Portanto, quanto mais o país se vacinou, maior foi o crescimento do PIB nos últimos trimestres daquele país. Sendo assim, já é comprovada essa correlação positiva entre aumento da vacinação e recuperação da atividade econômica.

[IDEF] Sobre essa questão da capacidade e condição dos entes subnacionais, será que poderíamos considerar que todos os estados e municípios conseguiriam tomar essas decisões autônomas? No momento, o essencial mesmo seria estabelecer essa união entre os entes federativos brasileiros?

Isso é uma questão complicada. Por exemplo, quem é que lideraria, por exemplo, uma coalizão dos governadores? Se não é o Presidente que lidera, não há como atuar. Ainda que Dória (SP), pudesse se colocar como uma liderança, seria pouco provável que ele conseguisse se efetivar como uma real liderança. Imagine, por exemplo, a dificuldade que seria para um governador que, além de pensar o seu estado, precisaria pensar o Brasil ao mesmo tempo? É muito delicado. Outro problema: a questão do orçamento. Como se estabeleceria um orçamento para essa coalizão? Se não é o Governo Federal que libera esse orçamento, que libera pessoal e consegue articular, esse Federalismo absolutamente descentralizado é impossível.

O Governo Federal é importante para, digamos, fazer a costura desse tecido do federalismo brasileiro. A autonomia por si só, ela tem muitas limitações. O Governo Federal deve estar presente nesse momento. 

Em alguns momentos, claro, o federalismo descentralizado é importante porque, sobretudo, aumenta a eficiência de alguns castos. Porém, se não houver o Governo Federal para coordenar alguns assuntos, não funciona. Para que a República Federativa funcione, de fato, é necessário haver os dois lados da moeda, no final das contas.

[IDEF] Por fim, de que forma as experiências internacionais poderiam auxiliar nossos governos locais (municípios e estados) a alavancarem o desenvolvimento econômico?

Alguns exemplos estão ligados a determinados setores e regiões, e voltamos ao tópico da complexidade produtiva. Vimos que, há pouco tempo, faltou insumo para se fazer entubação no Brasil. Em Pernambuco, temos uma indústria farmacêutica, a Lafepe – não sei se ela ainda é estadual ou não -, mas ela era uma empresa estadual que produzia medicamentos genéricos. O governo do estado poderia, por exemplo, criar um programa de incentivo à produção desse tipo de medicamento nessa fábrica, ou então fazer uma expansão para que ela pudesse ampliar a produção desse tipo de produto. Isso falamos de produção de luvas, para empresas que produzem material em látex e plásticos, podemos falar também de usinas para produzir álcool em gel, etc. A premissa básica é fazer com que a estrutura produtiva se volte para resolver esses problemas imediatos. Inclusive, se espera que a Covid-19 não seja uma doença passageira, e sim uma doença de vacinação anual. Então, é possível que de vez em quando passemos por surtos. De toda maneira, uma estrutura que seja capaz de resolver esse e outros problemas de saúde é estritamente necessária em qualquer país. Uma possibilidade é investir mesmo, criar mecanismos de incentivo e créditos, para que as indústrias se instalem nesses territórios. Indústrias ligadas ao setor farmacêutico, acima de tudo, para que esses produtos sejam criados no território, de preferência com capital nacional. Isso é importante pois o capital nacional tende a utilizar o excedente, o lucro, reinvestido no seu próprio país. É muito mais fácil empresas estrangeiras repatriar lucros e dividendos, do que uma empresa local. Claro, os empresários podem jogar para paraísos fiscais, etc. Porém, fica muito mais fácil ter o controle desse excedente se é um empresário local, se ele gasta aqui e reinveste esse dinheiro no país.

Eu particularmente sou adepto dessa tese de que o capital nacional deve ser o carro chefe de qualquer programa de desenvolvimento que seja capitaneado pelo estado, pois o capital nacional tende a gerar efeitos multiplicadores na economia, muito mais do que o capital estrangeiro.

E claro, com o desenvolvimento interno em tecnologia, com uso de mão de obra local, com uso de potencial intelectual local, universidades, etc. Acredito que o caminho seria estimular os setores que vão subsidiar a resolução do problema da saúde, que posteriormente, ou poderá retornar às suas atividades sociais ou poderá se manter como um grande fornecedor desse tipo de material médico-hospitalar. Portanto, é uma ideia que vale a pena, pois tem uma elevada complexidade econômica e é estritamente necessário na situação atual.

[IDEF] O Senhor acredita que, para efetivamente os estados e municípios brasileiros poderem alavancar o desenvolvimento econômico, seria vantajoso pensar nesses exemplos de práticas internacionais e observá-los com mais eficácia, para poder trazer essas experiências para o contexto brasileiro?

Então, alguns fatores devem ser levados em consideração. Tem coisas que os estados e municípios podem fazer, já outras não. Por exemplo, a Legislação Trabalhista, que é uma norma federal, não pode ser alterada ou diferenciada por um grupo de estados. Para atrair capital estrangeiro que queira fazer montagem de Iphone, como uma região da China conseguiu atrair nos últimos anos, é necessário que haja uma flexibilidade muito grande nas relações de trabalho. Mas até que ponto esse tipo de atividade, esse tipo de trabalho, que do ponto de vista do produto final tem elevada complexidade, mas do ponto de vista da operação em si é apenas montagem. Até que ponto esse tipo de operação, de mudanças, de criação de zonas de exceção – zonas especiais -, até que ponto isso é vantajoso para essa região? Até que ponto isso vale a pena? Por isso, acredito que quando temos que pensar em desenvolvimento e mudança estrutural, devemos pensar em uma mudança a partir de fatores internos (endógenos). Sim, é interessante trazer esse tipo de atividade, por exemplo, se existe um carro-chefe, uma grande atividade que vai puxar outras atividades ao redor, e efetivamente essa atividade terá um efeito multiplicador, um efeito de encadeamento na economia local, porque se for simplesmente uma atividade de montagem, onde as peças chegam de fora (outros países) e a qualificação é de toda de fora, apenas a empresa e os trabalhadores são locais, e os produtos são todos exportados, que tipo de qualidade de trabalho é essa? Que qualidade de estrutura produtiva é essa? Será que vale a pena? Muitos fatores devem ser avaliados. Deve haver um processo de desenvolvimento, um pontapé inicial, que seja endógeno, um elemento que contribua efetivamente para a propagação daquela benesses dentro daquela região. 

É aquilo que chamamos de enclave econômico. A Fiat em Goiana (PE), por exemplo, uma parte dos fornecedores não são de Goiana, boa parte da produção vem de outros estados. E o que se faz em Goiana? Simplesmente se utiliza a mão de obra, que não é só da cidade (inclui a região, chegando até em JP, inclusive). Porém, não existe um efeito multiplicador efetivo da produção ali, naquela região. Ainda que a região seja uma montadora, não vemos os efeitos de arrastamento, que são realmente importantes para a economia local. É necessário se ter muito cuidado quando cria-se essas zonas especiais, pois elas precisam ter um estudo sobre viabilidade e impacto, além da efetividade da participação e da contribuição que ela pode trazer para a economia local, mas sempre levando em consideração que sem o Governo Federal boa parte dessas condições não vão conseguir se concretizar, uma vez que existe a Legislação Federal. O capitalismo por si só já é um sistema destruidor, eu sou um crítico absoluto desse sistema. Mas entendendo que a economia hoje é uma economia capitalista e o desenvolvimento hoje ainda é um desenvolvimento da lógica capitalista, para minimizar esses problemas o capitalismo deve ser sim controlado, pois se for deixado aos interesses dos empresários, obviamente eles, de uma maneira geral, não vão se importar muito com aquilo que acontece nos países periféricos.

Apenas quando há interesse econômico é que os países avançados se preocupam com o que acontece nos países mais pobres.

Por exemplo, os produtores franceses (europeus em geral) preocupados com a Amazônia mas também preocupados com seus próprios produtores nacionais, ou seja, com a sua própria agricultura nacional. 

Enfim, essas experiências internacionais devem ser muito bem estudadas. Na China, por exemplo, há grandes experiências positivas, mas não fosse o Estado chinês interferindo (o Governo Federal), essas zonas especiais não teriam a mesma capacidade. Existem fatores associados que são fundamentais, como a engenharia reversa, por exemplo.

Esses exemplos servem como estudo de caso, mas não se pode replicar exatamente da mesma forma no Brasil. Portanto, deve-se sempre levar em consideração as situações de lá e de cá. Não existe receita de bolo para o desenvolvimento econômico, pois cada país tem sua história, e cada capitalismo terá suas próprias características. 

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