Entrevista Helder Cortez, atual diretor da CAGECE (Companhia de Água e Esgoto do Ceará) discute sobre o sistema de esgoto condominial e seu processo de internacionalização

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O IDeF entrevistou o atual Diretor de Negócios do Interior da CAGECE, Helder Cortez, responsável pelo projeto Sisar (Sistema Integrado de Saneamento Rural), internacionalizado com parceria do UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância). O diretor discute sobre as questões administrativas do projeto e também acerca da internacionalização da política pública. 

O Sisar é um sistema de esgoto condominial, de baixo custo, e que incentiva a participação das comunidades rurais na administração do sistema de abastecimento de água de forma autossustentável e sem desperdício. Como funcionário de carreira e atual Diretor de Negócio do Interior da CAGECE, qual o seu papel na construção do Sisar? Em algum momento esta política pública foi afetada pela agenda internacional?

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O saneamento rural do Ceará foi provocado através de um empréstimo do Banco Alemão KFW. Nós já tínhamos empréstimos com o Banco Mundial, como a Paraíba tem, como todo estado tem, de combate à pobreza. O Banco Mundial sempre se propôs a dar o empréstimo e esperar que os resultados viessem, enquanto que o Banco Alemão não. A CAGECE é a companhia de maior expertise de saneamento do Ceará, atua em 82% dos municípios do Ceará. Então, o governo do Estado pediu para que nós fizéssemos o programa do KFW. Com o amadurecimento do projeto, o banco alemão exigiu que nós criássemos uma gerência para dar atenção e cuidado ao rural e foi aí, há 25 anos atrás, que a gente começou. Foi nesse período que se criou a estrutura da nossa empresa para dar atenção ao rural, inicialmente era apenas para água. Nesse sentido, o banco alemão nos levou a criar o Sisar, 7 anos depois fizemos outro empréstimo. A CAGECE e o governo do estado disseram que os indicadores de saúde e social do primeiro Sisar subiram, assim não havia o porquê fazer empréstimo com o Banco Mundial, se era para fazer sem um direcionamento correto. 

“Nesse sentido, o banco alemão nos levou a criar o Sisar”.

Como se deu o processo de internacionalização do sistema de esgoto condominial para a Etiópia? A CAGECE tem conhecimento dos resultados dessa implementação no exterior e esse processo de exportação resultou em algum aprendizado interno na CAGECE?

A CAGECE,  ANA (Agência Nacional de Água e Saneamento Básico),  FUNASA (Fundação Nacional de Saúde), a Secretaria da Cidade e  Agência reguladora do Ceará, junto com o UNICEF,  foram em uma missão para a Etiópia e lá entenderam ser possível pegar um conjunto residencial semelhante ao “Minha Casa Minha Vida” e fazer um projeto de coleta e tratamento de esgoto semelhante ao Sisar. Não diria que foi condominial porque fizemos somente em um prédio, que tinha entre 70 a 120 famílias. Depois nós fomos para orientar a fazer o sistema de gestão, mas o projeto se perdeu no tempo, não avançou muito não. A gestão de Angola se aconselhou com os gestores da Etiópia, e o Unicef e, do mesmo jeito, queriam esgoto condominial. Eles viram a possibilidade de emprego e renda com o esgoto condominial. A nossa ideia é capacitar a equipe, tanto na Etiópia quanto na Angola. Eu quero envolver as universidades para ajudar e eles entenderem como a gente elabora o projeto e fiscaliza as obras. A ideia é deixar uma herança para eles, o Sul-Sul ajudando Sul-Sul. Sobre o sistema na Etiópia, ele está funcionando mas a gestão não foi implementada e como são blocos de prédios não caracteriza bem o condominial. Apesar de ser uma relação sul-sul, um país [Brasil] é mais desenvolvido que outro, então eu entendo que eles é que principalmente aprenderam com a Cagece.

“A ideia é deixar uma herança para eles, o Sul-Sul ajudando Sul-Sul”.

Como se deu o diálogo da CAGECE com os outros agentes para levar o modelo para fora?

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A ANA é uma empresa nova que regula o sistema hídrico, ela se impressionou com a CAGECE pelo seu sistema ser de macromedição e micromedição, o qual auxilia no processo de medição e diminuição de perdas de abastecimento. A Funasa também e o UNICEF viram os trabalhos publicados, o UNICEF do Ceará divulgou para a do Brasil e eles acharam uma excelente agenda. Hoje a cadeia é muito grande e a relação de amizade entre os países é muito importante. O Unicef ficou feliz em ter o Brasil nessas cooperações e o Ministro também ficou muito feliz. 

Na sua experiência enquanto diretor da Cagece, a atuação internacional dos agentes subnacionais pode influenciar na solução do enfrentamento dos problemas sociais locais, como em medidas como a seca e saneamento básico? Houve algum avanço em relação à temática?  

“A comunidade está desde o pensar inicial do projeto, não existe, no modelo de gestão do Sisar, a engenharia separada do social”.

Sisar é um sistema integrado de saneamento básico. É um sistema autogerido pelas associações e é autossustentável, sendo a comunidade quem consome e mantém com os pagamentos. Nesse sentido, há um empoderamento da comunidade. A comunidade está desde o pensar inicial do projeto, não existe, no modelo de gestão do Sisar, a engenharia separada do social. Além disso, na administração do projeto existem três gestores e um grande grau de interatividade: o técnico, o social e o financeiro. A cooperação chegou primeiro no nível técnico, há um ganho e um reconhecimento internacional de tudo. A relação entre os agentes têm evoluído e prestigiado muita gente. No entanto, o que mais tem atrapalhado na internacionalização são as políticas nacionais dos países, como foi no caso da Etiópia, que apesar de ter recebido o modelo de política sanitária do Brasil, num processo de transferência de política pública, tiveram empecilhos devido a questões de decisão interna do país.

Apesar disso, pontos positivos foram destacados pela UNICEF (2018); o aprendizado de técnicas de saneamento que contribuíram para os sistemas de esgoto e abastecimento d’água em acampamentos de refugiados; e o transbordamento do processo para Angola. Esse processo de Angola está começando agora. O  grande desafio é superar as barreiras administrativas e governamentais, permitindo que ou o Banco Mundial ou o Unicef consigam negociar as condições para implantar o projeto lá na África.Nesse processo de internacionalização da política pública de saneamento, existe a transferência de conhecimento sobre as questões de regulação sanitária e também de acesso à água. Essa transferência é viabilizada com a ajuda de diferentes agentes internacionais como o UNICEF, o Banco Mundial e o banco alemão. Isso é importante para expandir o modelo sisar para outras regiões e alcançar resultados positivos. Estamos trabalhando para isso junto com os parceiros da cooperação internacional.

“Nesse processo de internacionalização da política pública de saneamento, existe a transferência de conhecimento sobre as questões de regulação sanitária e também de acesso à água. Essa transferência é viabilizada com a ajuda de diferentes agentes internacionais”

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