Andrej Silvnik (OIT Brasil) fala do Projeto SCORE e sua metodologia para melhoria da produtividade e das condições de trabalho das empresas.

-

Graduado em Economia na UNICAP, mestre e PhD em História pela mesma universidade, Andrej Slivnik atualmente trabalha na OIT Brasil liderando a implementação do Projeto SCORE no Brasil. O projeto, derivado da metodologia de mesmo nome, visa ao aumento da produtividade de micro e pequenas empresas através do trabalho decente e diálogo social.

 O Projeto Score visa melhorar a produtividade e as condições de trabalho para pequenas e médias empresas com foco inicial para o setor têxtil e de confecções da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP). Como surgiu a iniciativa deste projeto e por qual motivo a escolha inicial foi o setor têxtil paulista?

Andrej Silvnik: O Score é um projeto global da OIT que tem como foco a melhoria da produtividade de pequenas e médias empresas. Ele já existe em mais de 20 países, e não tem apenas como objetivo a atuação no setor têxtil, mas também junto a empresas com porte pequeno e médio. O Brasil foi escolhido para trazer o Projeto Score devido à grande tradição da OIT em trabalhar com indústrias do setor têxtil, sendo este um dos setores que mais emprega na indústria de transformação, porém um setor que enfrenta dificuldades do ponto de vista da vulnerabilidade e condições de trabalho dos funcionários do setor. A indústria têxtil é um setor muito heterogêneo, muito desigual, com situações de trabalho variadas, especialmente em empresas menores. Logo, nosso objetivo inicial era trabalhar com este setor, que já tínhamos tradição de parcerias, mas com um grupo específico e diferente do que havíamos trabalhado (setores micro e grandes oficinas). Este projeto se insere no meio da cadeia produtiva da confecção, pois tem condições de gerar efeitos positivos para baixo e para cima da cadeia. Outra justificativa é pela escolha de São Paulo: primeiro porque é a origem do recurso pelo Ministério Público de São Paulo, mas principalmente porque é um dos principais polos de confecção do Brasil e pela grande infraestrutura de serviços que são muito importantes para a execução do projeto e de outras parcerias que fazem parte da rede ampla, com facilidades estruturais para conduzir a fase inicial do projeto, antes de ser projetada a expansão a outras regiões.

É possível que outros setores sejam contemplados nesse projeto ao longo de sua duração? Quais?

Andrej Silvnik: Nessa duração (até 2024) eu acho difícil, porque o processo para implementar este projeto em um determinado setor é muito demorado e minucioso, então a gente realiza diversos diagnósticos do setor, entende as necessidades, desafios na melhoria de condições de trabalho no setor e na produtividade, além de muitas atividades de engajamento de associações setoriais e sindicatos. A OIT é uma organização tripartite, então tudo que a gente trabalha segue em comum acordo com o governo, os empregadores e os trabalhadores, que precisam sempre desse trabalho de engajamento com as diferentes partes, então nesse período até 2024 não. Para expandirmos a outros setores, precisamos de recursos adicionais para fazer as atividades necessárias, o que talvez conseguiríamos nesse intervalo é levar o projeto a outras regiões/polos de confecção pelo país. No caso da confecção, em especial, o Nordeste tem alguns polos de confecção importantes, o agreste pernambucano, o Ceará e algumas regiões importantes de calçados em Mossoró e no interior da Bahia. Porém, a ideia do projeto não é implementar em todos esses pontos, mas a parceria com o SENAI: a ideia é que o SENAI implemente a metodologia Score em vários polos a depender do seu interesse e disponibilidade. Então,o objetivo do projeto é capacitar o SENAI e transferir essa metodologia de modo a expandir o projeto a outras regiões. Apesar disso, também depende da logística do diagnóstico, por exemplo no caso do agreste pernambucano, é muito diferente do polo paulistano, com diferentes contextos que precisam ser considerados em eventuais ajustes na transferência do projeto. A metodologia é a mesma no sentido de que alguns princípios são compartilhados em todas as experiências globais, mas sempre adaptadas às realidades locais, como na Índia, Etiópia, República Dominicana, Vietnã, em vários lugares que residem a metodologia! Toda vez que levamos esse projeto a um novo local, adaptamos ele à realidade da região de transferência, sempre compreendendo que cada contexto de implementação é diferente, com desafios próprios. Isto é importante para uma organização como a OIT.

Chegando ao fim do segundo ano do projeto, até então foram realizadas consultorias e treinamentos para quais empresas do setor têxtil de São Paulo?

Andrej Silvnik:  Vamos iniciar as consultorias no primeiro semestre do ano que vem. O que foi feito até agora foram as atividades de diagnóstico setorial e adaptação da metodologia ao contexto brasileiro, que tomam muito tempo e dependem de muito diálogo com o setor. Nós visitamos muitas fábricas, conservamos com muitos empresários, sindicatos de trabalhadores, com as marcas dos varejos da moda (principais clientes da indústria) e a partir destes diagnósticos, fizemos uma adaptação da metodologia para entender o que de fato é fundamental trabalharmos. Além disso, estamos produzindo um acordo de cooperação com o SENAI de São Paulo, que vai ser capacitado e responsável por fazer o projeto piloto com um conjunto de empresas na região acompanhado pela OIT e a partir disso, a ideia é transferir a metodologia para o SENAI – uma empresa brasileira – para que ela possa tocar o projeto para frente sem a presença da OIT na execução. Caso quiséssemos levar o projeto a outras regiões, teríamos que cooperar com os outros SENAIs do estado. O SENAI é muito respeitado internacionalmente, com uma capacidade técnica incrível e, para a OIT, o objetivo é fortalecer ainda mais essa capacidade já existente através de ajuda na consolidação de estratégias na condução de relações humanas no processo produtivo, a característica principal do SCORE.

Como funciona a metodologia SCORE?

Andrej Silvnik: A metodologia tem foco no aumento da produtividade e melhoria das condições de trabalho. Mas como? Fortalecendo práticas de trabalho colaborativas nas fábricas, acreditando que se gestores e colaboradores tiverem uma relação mais colaborativa, não só as condições de trabalho serão melhores, como também a produtividade. Isso é feito em vários aspectos do processo produtivo com foco na colaboração, então o programa é estruturado nesses módulos temáticos de acordo com as áreas a melhorar. Cada módulo tem duas fases: a de treinamento em sala de aula, com dois gestores e dois trabalhadores da fábrica, que serão treinados juntos e terão que aprender a escutar um ao outro e encontrar soluções conjuntas dos problemas que enfrentam na fábrica. Eles saem dessa aula com um conjunto de pontos comprometidos com a mudança e melhoria na fábrica, implementadas as propostas na fábrica, que depois vai haver uma fase de consultoria que nossos treinadores veem o que foi feito na fábrica e propõe alguns ajustes no refino do processo. De modo geral, existem cerca de 30 módulos quadrimestrais desenvolvidos ao longo dos anos: o básico – modo de colaboração –, que estimula a colaboração, comunicação entre as pessoas e o estímulo da escuta; depois temos o módulo de produção mais eficiente; controle de qualidade para atendimento dos clientes; saúde e segurança ocupacional; gestão de pessoas; módulos de gestão do tempo de trabalho de modo a evitar jornadas extenuantes; de igualdade de gênero no ambiente de trabalho; colaboração ao uso consciente de recursos e gestão de resíduos a partir do engajamento do trabalhador. A tese do nosso programa é que essas melhorias trarão à empresa maior produtividade e consequentemente mais lucro, revertidos em salários melhores e melhores condições de trabalho aos empregadores. Acreditamos que ao final, todos ganharão: o empresário que terá mais lucro, o trabalhador que trabalha em condições mais saudáveis e salários mais dignos.

Como se dá de fato a parceria entre a OIT Brasil, a Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecções (ABIT) e a Associação Brasileira de Varejo Têxtil (ABVTEX)?

Andrej Silvnik: Como a OIT é uma organização tripartite, este projeto tem uma associação forte com os empregadores. Temos um longo histórico de parcerias com a ABIT e ABVTEX, tendo em vista que as empresas têxteis são as que mais empregam no país. No SCORE, elas participam da instância de deliberação no comitê executivo, que acompanha todas as etapas do projeto, reuniões e processos da OIT na trajetória. Eles estão nos ajudando não apenas com insumos técnicos para a estratégia do projeto, mas com o engajamento das empresas a participarem, tanto das indústrias no caso da ABIT, quanto do varejo no caso da ABVTEX. Realizamos uma oficina no final de 2021, na qual participaram várias marcas e umas das maiores fábricas de São Paulo, além da Central Única de Trabalhadores (CUT), representando os trabalhadores e o SENAI. Foi uma oficina para o diálogo social entre as diversas partes do setor, no qual apresentamos o diagnóstico do setor e algumas atividades de discussão entre os setores, em que eles puderam relatar visões diferentes sobre a indústria e quais seus desafios particulares. Foi bem interessante esse diálogo, que representa um dos princípios da OIT.

Quais são os resultados do projeto até agora e quais outros resultados vocês esperam?

Andrej Silvnik: Evoluímos bastante na consolidação do diálogo entre atores da cadeia nos temas de melhoria das condições de trabalho e sua relação com a produtividade. Também conseguimos identificar questões do âmbito individual da fábrica, porém existem questões coletivas da indústria. Além disso, trouxemos o convencimento do SENAI para a sua inserção nas questões e o papel dele na melhoria dos processos produtivos e das condições de trabalho no setor também. Os resultados daqui para frente são melhorias nos indicadores das empresas participantes, aumento de produção, redução do número de acidentes de trabalho, redução de adoecimento por saúde mental, melhoria nos canais de comunicação interno das empresas, redução da rotatividade do trabalho e do número de demissões, redução dos casos de discriminação e assédio, no gasto de energia e na gestão de resíduos. A ideia é que tenha resultado na fábrica, retornando após o projeto encaminhado pelo SENAI. 

Leave A Reply

Please enter your comment!
Please enter your name here

Publicações relacionadas