SPRegula e ISWA: cooperação internacional para recuperação energética

-

O IDeF conversou com representantes da SP Regula – Agência Reguladora de Serviços Públicos do Município de São Paulo – sobre a cooperação internacional com a a Associação Internacional de Resíduos Sólidos (ISWA, sigla em inglês). O projeto discutido na entrevista consiste em um termo de cooperação entre a extinta Autoridade Municipal de Limpeza Urbana (AMLURB), cujas atribuições foram transferidas para a SP Regula, e a Associação Internacional de Resíduos Sólidos (ISWA), cujo objetivo consistia na realização de estudos de viabilidade para a implementação de modelo de recuperação energética e gerenciamento
de resíduos sólidos.

Mauro Haddad Nieri, Bacharel em Direito e Mestre em Direito Ambiental pela Universidade Católica de Santos. Foi Secretário de Meio Ambiente da Prefeitura de Cubatão, Diretor Adjunto Administrativo da Agência Metropolitana da Baixada Santista. É ex – Gerente de Saneamento Ambiental da SP Regula e, atualmente, Diretor da mesma agência.

David Tegangno, Bacharel em Administração de Empresas pela Universidade Norte do Paraná, atua na Prefeitura do Município de São Paulo desde 2002. Foi Coordenador de Programas I, Gerente de Controle e Monitoramento e Diretor de Gestão de Serviços da ALMURB entre 2013 e 2021, e atualmente atua na SP REGULA como Gerente de Saneamento Ambiental.

IDeF: Nós encontramos a matéria no site da SP Regula sobre o termo de cooperação que foi firmado entre a AMLURB e a International Solid Waste Association (ISWA), que mencionamos quando entramos em contato. A matéria fala que o termo de cooperação foi feito para realizar pesquisa para desenvolvimento de ações e de tecnologias para a gestão de
resíduos sólidos na capital de São Paulo. Mas, como o senhor falou no contato inicial, a AMLURB foi extinta. Então, inicialmente gostaríamos de saber: o termo de cooperação foi posto em prática, alguma outra agência assumiu a responsabilidade por ele?

Mauro Haddad: O presidente (da ISWA), na época, era um brasileiro e como é uma associação internacional, esse termo de cooperação foi instrumentalizado pela ABRELPE (Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública), se eu não me engano. A ABRELPE também foi extinta. E aí ela virou ABREMA, que não é uma sucessão. E nós não chegamos a firmar um termo da SPREGULA com a ISWA. O que tinha nesse termo, né? O que ele proporcionou? A própria ISWA contratou um estudo técnico de ecoparques aqui na cidade de São Paulo. Então a gente tem esse estudo técnico do ecoparque e da recuperação energética aqui na cidade de São Paulo, através desse termo da AMLURB com a ISWA. Eles fizeram o início do estudo de uma viabilidade ambiental, então isso também foi fruto desse convênio dessa época. Pegamos esse estudo, essas viabilidades do estudo, que foi feito dentro desse convênio, e colocamos para dentro do contrato.
Então ele rendeu frutos. Pegamos aquilo que foi pensado, que foi desenhado e colocamos no contrato. Então, apesar das entidades, dos organismos, não existirem mais, esse (estudo) da viabilidade técnica da recuperação energética e esse estudo técnico ambiental foram utilizados..

IDeF: E qual foi a contribuição dos estudos de viabilidade da ISWA para a cidade de São Paulo?

Mauro Haddad: Ela (a ISWA) fez o estudo de viabilidade da recuperação energética na cidade de São Paulo. Um estudo sobre a recuperação energética e sobre a concepção dos ecoparques, que é um modelo europeu, que está na Espanha, na Polônia, tem em alguns outros lugares em Portugal, que são esses centros de tratamento de resíduos.
E tem também a recuperação energética, então eles ajudaram na concepção do modelo e no estudo de viabilidade econômica, se caberia na cidade de São Paulo uma unidade dessa. Apesar de ser amplamente utilizado no mundo, na Europa, Japão, China, América do Norte, Estados Unidos, alguns lugares da Ásia, Dubai, Oriente próximo, Austrália, não tem nenhuma aqui na América Latina, não tem nenhuma aqui no Brasil. Então foi feito um estudo de viabilidade, que concluiu que daria para fazer. Então, autorizou-se que a gente colocasse isso no contrato, porque a gente estudou e viu que caberia aqui na cidade.

IDeF: Então, existe algum plano para efetivar isso? O senhor falou que está nos contratos atuais, então há algum plano para criar um ecoparque nesse modelo em São Paulo?

Mauro Haddad: Então, na verdade, o que a gente tinha? A gente tinha o Plano de Gestão de Resíduos, de 2014, que já falava isso (PLANCLIMA), que é o plano de ação climática. Já falava dos ecoparques e nós pegamos essa ideia e colocamos no contrato. Agora é uma obrigação contratual da concessionária, da empresa contratada pela cidade de São Paulo, efetivar. Já começamos a parte de licenciamento, a parte de início de obras de três ecoparques e das duas primeiras unidades de recuperação energética, as duas primeiras UREs, que estarão dentro desses ecoparques. São obras que levam 30, 40 meses, do início que nós
estamos até a entrega. Então, são obras longas, nós já começamos e as unidades já estão contratadas. Há um cronograma que vem desde o licenciamento, início de obras, contratação internacional e a execução.

IDeF: Então, entendo que são projetos longos e ainda estão meio distantes da conclusão. Mas o senhor consegue imaginar algum possível impacto gerado por essa cooperação internacional para a gestão de resíduos sólidos em São Paulo, a curto e a longo prazo?

Mauro Haddad: Para (medir) esses impactos temos o Planares (Plano Nacional de Resíduos Sólidos, que estabelece um conjunto de diretrizes e metas para a gestão dos resíduos sólidos no Brasil). O Planares tem degraus de 4 em 4 anos. Então, a concessionária tem o compromisso com a cidade, a contratante, de apresentar esses saltos de acordo com o Planares. Então, cruzamos o Planares em 27 com o aumento da coleta seletiva e do início do Ecoparque. E aí a gente passa o Planares e começa a estar acima da meta a partir de então. Então, esse é o compromisso. Nós pegamos esse compromisso, essa meta, e vinculamos ela à parte financeira. Você vê que em 27 tem um degrau azul, é o Planares. E a linha verde é a nossa execução real aqui do contrato. Então, a gente sai de 1.9 em 23, que era o que a gente separava de material que deixava de ir para o aterro. A gente cruza o Planares em 27, quando começam as primeiras entregas dos ecoparques. E aí a gente já fica acima dele. Então tem esses degraus que eles têm que entregar para gente até 2040, com um desvio de 70% do que vai para o aterro hoje. Em 2040, nós vamos tirar mais de 70% daquilo que vai para o aterro. Então, esse é o compromisso do que tá contratado. E se eles não entregarem, não tem entrega financeira.

E o que é importante também é que tem um verificador independente, que é a Fundação de Estudos Econômicos daqui da USP. Nós contratamos (a fundação) para fazer a verificação desses índices. Eles têm que fazer a coleta, tem que ter a qualidade do serviço, ele é avaliado pela qualidade do serviço. E o índice de recuperação é aquilo que ele está deixando de mandar lá para o aterro, aquilo que ele está colocando na coleta seletiva, na separação. Então, esse índice é importante para gente e todos esses índices formam a variação da nota, que é o
que ele vai receber. Então, temos um valor que é o Opex (aquilo que é da operação), que visa manter a operação, e temos a remuneração variável que depende do alcance dos índices. Se ele não conseguir (atingir o índice), ele não recebe o pagamento. Então, queremos a recuperação do resíduo, que o resíduo não vá para o aterro, que o resíduo não cause poluição. E como nós vamos fazer isso? Através dessa fórmula matemática.


Então a gente pega os planos e o instrumento de estudo dessa cooperação (internacional). Tem esse modelo. Cabe na cidade de São Paulo? Cabe. Colocamos isso dentro dos planos. Como é que a gente passa isso para a realidade? Contrato. Então, a gente põe no contrato e põe mecanismos no contrato de fiscalização da execução contratual, para que a gente garanta que isso vai ser cumprido.


O Brasil está nessa coluna com 43% de disposição irregular de resíduos, lixão e um monte de coisa sem controle nenhum. Essa não é a realidade de São Paulo. A meta do que vai para o aterro é de 30%, que é o que o Planares vai permitir que a gente mande para o aterro.

IDeF: Finalizando nossas perguntas, a gente gostaria de saber se os senhores acham esse
modelo de cooperação e os resultados dele replicáveis em outros lugares.

Mauro Haddad: De 2021 para 2022, nós fizemos parte de um programa da ONU chamado Waste Wise Cities. Você pega duas cidades que trocam experiência na área de resíduos. E nós servimos de benchmark para a cidade de Praia, que é a capital do Cabo Verde. Então, um país africano, um arquipélago, com 10 ilhas, e nós, a cidade de São Paulo, fomos para lá, depois eles vieram para cá, ficaram uma semana com a gente aqui, aprendendo, vendo o que a cidade de São Paulo faz. Na cidade de São Paulo são 12 milhões de habitantes e lá são 250.000 habitantes. Então não se compara. São duas cidades de difícil comparação. E eu faleiisso para o prefeito de Praia quando ele recebeu a gente. “Prefeito, estamos aqui, vocês vão lá, é importante, mas são cidades que não se comparam. Vocês precisam estudar e ver a solução de vocês”. A gente também foi para a Europa, ver as grandes cidades, era a próxima fase desse estudo de pegar grandes cidades do mundo. Ir nessas grandes cidades, ver o que acontece, mas chegar à nossa conclusão, porque o modelo europeu, o modelo asiático funciona para eles, não é a nossa cultura, não é a nossa realidade. A realidade da Alemanha é outra. Geográfica, cultural, até o clima influencia no modelo de gestão de resíduos, porque tem cidade que faz uma vez por semana coleta de resíduos, duas vezes por semana. Nesse calor aqui do Brasil, se eu não fizer, se eu atrasar 12 horas, eu já tenho o caos instaurado. A gente tem que chegar na nossa solução, ver o que tá acontecendo, conhecer, ver quais são as soluções, aplicar isso aqui dentro da nossa realidade.
Isso que é importante, porque às vezes a pessoa quer importar a solução e não dá certo. E a cidade de São Paulo passou por isso quando nós colocamos as centrais mecanizadas em 2014. São tecnologias europeias, da Alemanha, França. E chegou aqui e demorou para entender, porque o lixo de lá é diferente, a umidade do resíduo, mesmo do seco, é diferente da nossa. Então, a gente vê o que acontece lá e traz pra gente e internaliza dentro da nossa realidade aqui.

Leave A Reply

Please enter your comment!
Please enter your name here

Publicações relacionadas