Boa Vista (RR) desenvolve ações e firma parcerias para lidar com o problema migratório

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Segundo o relatório Refúgio em Números, publicado pelo Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE) e pela Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), no ano de 2018 o território brasileiro recebeu mais de 80 mil solicitações de refúgio para estrangeiros. Desse número, mais de 60 mil pedidos foram feitos por venezuelanos. (1)

Amazonas e Roraima estão entre os estados brasileiros que mais receberam solicitações de refúgio em 2018, respectivamente, mais de 10 mil e 50 mil pedidos. Isto ocorre, em grande parte, pois ambas as unidades federativas são regiões de fronteira com a Venezuela, que atualmente enfrenta uma crise sócio-política, e venezuelanos têm deixado o seu país por diferentes motivos, como a escassez de medicamentos, suprimentos médicos e alimentos, além de altas taxas de crimes violentos e a hiperinflação faz com que cidadãos venezuelanos deixem de ter acesso a cuidados básicos de saúde, trabalho e vida. (2)

Amazonas e Roraima estão entre os estados brasileiros que mais receberam solicitações de refúgio em 2018, respectivamente, mais de 10 mil e 50 mil pedidos.

Uma grande preocupação frente a esse fluxo migratório constante e crescente, se refere à capacidade do estado de Roraima, que tem baixa renda per capita e poucas oportunidades econômicas, em oferecer acolhimento e acompanhamento para os imigrantes que se instalam no estado. Isto, pois, além do acompanhamento legal e de regularização, é necessário que haja políticas públicas e de desenvolvimento econômico que acompanhem o novo índice demográfico do estado, e especificamente, do município de Boa Vista, território mais atingido pelo fluxo migratório oriundo da Venezuela.

Boa Vista, Roraima, 2019. Foto: Francisco Proner.

É necessário levantar respostas ao fenômeno representado pelos fluxos migratórios, a fim de elaborar políticas eficazes. O estado de Roraima e o município de Boa Vista vêm adotando uma série de projetos e políticas focadas em acolhimento e incremento da educação de Venezuelanos, a fim de inserí-los no território de forma autônoma. Por meio de oficinas e atividades diversas aplicadas por meio de apoio técnico e financeiro internacional, o município de Boa Vista promove o compartilhamento de conhecimento ­– em educação financeira e judicial –, entre os imigrantes, de forma que se viabilize o desenvolvimento econômico local.

O estado de Roraima e o município de Boa Vista vêm adotando uma série de projetos e políticas focadas em acolhimento e incremento da educação de Venezuelanos

CONHECENDO O FLUXO MIGRATÓRIO

A maioria dos venezuelanos que deixaram o país e chegam a Roraima estão em situação irregular, tornando-se mais vulneráveis a qualquer forma de exploração, abuso, violência, tráfico e discriminação. Para combater essas situações, é necessário a adoção de medidas que permitam a regularização do status migratório desses imigrantes, garantindo sua integração nos países receptores de maneira digna e segura.

Além de reconhecer as necessidades legais e de regularização dos imigrantes, é necessário inserí-los profissionalmente no território.

Além de reconhecer as necessidades legais e de regularização dos imigrantes, é necessário inserí-los profissionalmente no território. Um recente levantamento feito pelo ACNUR junto a mais de mil venezuelanos abrigados em Boa Vista, identificou uma centena de diferentes capacidades profissionais, incluindo pessoas com formação universitária e trabalhadores autônomos. Diante desse quadro, os municípios devem adotar projetos capazes de potencializar o perfil do imigrante, inserindo-os na dinâmica econômica e produtiva local.

Os municípios devem adotar projetos capazes de potencializar o perfil do imigrante, inserindo-os na dinâmica econômica e produtiva local.

APOIO INTERNACIONAL COMO ESTRATÉGIA

O Alto-Comissário da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), Filippo Grandi, concluiu uma visita de quatro dias ao Brasil com um apelo urgente por maior engajamento internacional, inclusive por instituições financeiras e agentes de desenvolvimento, nas comunidades que abrigam refugiados e migrantes venezuelanos.

​Segundo Grandi, “É vital que os esforços das autoridades nos níveis federal, estadual e municipal, bem como da sociedade civil, grupos eclesiais e brasileiros em geral, sejam adequadamente apoiados pela comunidade internacional. A população local tem estado na vanguarda da resposta às necessidades dos refugiados e migrantes venezuelanos. Eles não devem ser deixados sozinhos.”. (4)

​Em uma resolução publicada em março de 2018, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão oficial que interpreta os padrões regionais de direitos humanos, instou os membros da Organização dos Estados Americanos (OEA) a adotarem uma série de medidas em resposta à massiva imigração venezuelana nas Américas. (5)

Um dessas medidas impele à expansão de canais regulares, seguros e acessíveis para a migração por meio de progressiva expansão da concessão de vistos e regimes de visto facilitados e facilmente acessíveis, ou outras medidas legais para a residência no país. Em Roraima, acordos de cooperação internacional recém assinados promovem uma resposta à referida expansão e acolhimento legal aos imigrantes, conforme abordado a seguir.

Em Roraima, acordos de cooperação internacional recém assinados promovem uma resposta à referida expansão e acolhimento legal aos imigrantes

A ATUAÇÃO DO PNUD NO AUXÍLIO A PROJETOS PARA ACOLHER REFUGIADOS

O PNUD iniciou, em 2018, o projeto “Fortalecimento da reintegração socioeconômica e promoção de oportunidades de desenvolvimento inclusivo para migrantes no Brasil”. Ainda naquele ano, foram realizados, em parceria com o Governo Federal, Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) e o setor privado, seminários para sensibilizar empresas locais para a inclusão de migrantes em sua força de trabalho.

            Serão desenvolvidas ações focadas nos eixos de educação, geração de renda, inclusão produtiva e promoção de convivência, fortalecendo as perspectivas de desenvolvimento humano inclusivo para os migrantes venezuelanos

Em 2019, o PNUD iniciou sua ação-piloto em Boa Vista. Na primeira etapa, a iniciativa prioriza a criação de metodologias voltadas à promoção do desenvolvimento local em contextos de migração, fortalecendo capacidades e criando oportunidades para as populações mais vulneráveis. Serão desenvolvidas ações focadas nos eixos de educação, geração de renda, inclusão produtiva e promoção de convivência, fortalecendo as perspectivas de desenvolvimento humano inclusivo para os migrantes venezuelanos que chegam ao território nacional e para os brasileiros residentes nas comunidades mais afetadas pelo fluxo migratório.

O projeto está alinhado com a implementação da Agenda 2030 e dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, mais precisamente o ODS 16 (“Promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas”).

POLÍTICAS EDUCACIONAIS ADOTADAS POR BOA VISTA

Com o objetivo de promover oportunidades de integração social e econômica em Roraima e reconhecendo que refugiados podem trazer grandes benefícios à comunidade de acolhida, desde que tenham a oportunidade de investir em suas aptidões, o município de Boa Vista tem promovido ações conjuntas à entidades internacionais, como PNUD e ACNUR.

​Os projetos são diversos, desde aqueles com o intuito de fomentar a consciência empreendedora sustentável, passando por apoio legal e judicial para atender as necessidades de regularização do imigrante, até o acesso a informações básicas que darão mais autonomia e conhecimento sobre seus direitos civis, tudo isso versando ainda a inclusão socioeconômica dos imigrantes.

Seminário “Nova Lei de Migração – Uma Janela de Oportunidades”

Ocorrido em Roraima e também presente em outros estados brasileiros (6), o Seminário “Nova Lei de Migração – Uma Janela de Oportunidades” integra a estratégia de reintegração socioeconômica de refugiados e migrantes venezuelanos no Brasil, desenvolvida pelo PNUD em parceria com o ACNUR e outras agências da ONU. Por meio do seminário, criam-se discussões acerca de formas de inserção de imigrantes no mercado econômico e de trabalho, tendo como objetivo apresentar a nova Lei de Migração para o empresariado do estado e sanar dúvidas com relação à contratação de trabalhadores refugiados e imigrantes

Em Boa Vista (RR), durante o seminário, que fora promovido pelo Fórum das Federações Representativas de Classes Empresariais de Roraima e pelo Comitê Federal de Assistência Emergencial, em parceria com o ACNUR e o PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), acordos de cooperação foram assinados entre a ACNUR (Agência da ONU para Refugiados), o SENAC (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial) e o Tribunal de Justiça de Roraima. Os acordos vão contribuir para a integração de venezuelanos e para a garantia dos direitos civis das pessoas mais vulneráveis entre essa população, como analisado no próximo tópico.

Cursos de português e qualificação profissional

Acordos de cooperação assinados entre a Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC) firmaram um convênio de cooperação técnica e pedagógica, por meio do oferecimento a refugiados de cursos de português e de qualificação profissional. Já o acordo de cooperação entre ACNUR com o Tribunal de Justiça prevê o atendimento judicial itinerante aos venezuelanos em Roraima para evitar a violação de seus direitos fundamentais.

Os acordos de cooperação foram assinados pela representante do ACNUR no Brasil, Isabel Marquez, pelo coordenador do Fórum das Federações Representativas de Classes Empresariais de Roraima, Ademir Santos, e pela presidente do Tribunal de Justiça de Roraima, desembargadora Elaine Bianchi.

​Para efetivar as aulas de português e os cursos profissionalizantes oferecidos pelo SENAC, o ACNUR irá disponibilizar espaço físico e equipamentos para aulas teóricas e práticas, divulgar a oferta de cursos junto à comunidade interessada e assegurar a escolaridade mínima exigida nas matrículas. O SENAC irá fornecer os professores e outros profissionais necessários à realização dos cursos e emitirá os certificados dos alunos aprovados.

​Quanto ao serviço Judicial Itinerante do Tribunal de Justiça, será dada prioridade para a homologação de acordos nas causas cíveis que envolvam matérias como reconhecimento e extinção de união estável, reconhecimento de paternidade, fixação, revisão e extinção de pensão alimentícia, posse e guarda de filhos menores e regulamentação de visitas. O Tribunal de Justiça arcará com os ônus (diárias e deslocamentos) da equipe da Justiça Itinerante. (7)

Educação financeira: evento incentiva empreendedorismo para refugiados e brasileiros em Boa Vista

Com o objetivo de promover oportunidades de integração social e econômica em Roraima, o evento Inspira Boa Vista reuniu no início de agosto de 2019 mais de 80 instituições da área de educação financeira e empreendedorismo. O encontro, que foi idealizado para inspirar refugiados, migrantes e brasileiros a iniciar seus próprios negócios na região, ofereceu aos participantes oficinas e palestras voltadas à geração de renda e ao planejamento financeiro. O evento, idealizado pelo Centro Integrado de Estudos e Programas de Desenvolvimento Sustentável (CIEDS), foi uma ação colaborativa entre organizações da sociedade civil, setor público, privado e agências do Sistema das Nações Unidas.

A Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) apoiou o evento disponibilizando promotores comunitários refugiados e brasileiros que facilitaram o acesso ao evento e conduziram os visitantes aos expositores. A iniciativa recebeu também o suporte financeiro da União Europeia, que tem contribuído com o fortalecimento da resposta aos venezuelanos na região norte do Brasil e ajudando a promover a integração e a convivência pacífica dessas pessoas com a comunidade local.

​A ONU Mulheres promoveu a exposição de produtos fabricados por mulheres venezuelanas e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) articulou a vinda de palestrantes como o analista de Promoção de Cidadania Financeira do Banco Central, João Evangelista.

​Cerca de 60 atividades gratuitas foram oferecidas durante os dois dias de evento (3 e 4 de agosto), que contou com a participação de aproximadamente 1 mil pessoas. Cada adulto visitante recebeu um “passaporte” com a lista de atividades no qual gostaria de participar como, por exemplo, as oficinas sobre formalização como Microempreendedor Individual (MEI), empreendedorismo, produção de materiais eco sustentáveis, escola de Youtubers, panificação caseira, além de postos de informação sobre estágio, start-up e acesso a crédito. Ao final, o Inspira Boa Vista contabilizou mais de 5,6 mil atendimentos. (8)

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